A sete chaves

E de novo, o coração fecha-se. Tranca-se a sete chaves.
De novo, volto ás leituras. Volto ao mundo que um dia criei.
Volto ás roupas pretas.
E o preto é de novo a única cor que tolero.
Desisto da ilusão a que forçosamente me obriguei a viver, e a cortina que antes separava a realidade crua desta ilusão a cor de rosa, cai.
Volto ao que era antes. E agora que, de novo, questiono o inquestionável, estou ciente do mundo onde vivo.
Deste mundo, que não pode ser mudado.
Finalmente estou ciente daquilo que sou: Apenas alguém na busca da sua própria identidade

Os rostos que eu ontem julgava amáveis, são hoje os rostos neutros que evito.
A companhia de que ontem dependia, é nada mais que a companhia que hoje desprezo.
Hoje, desejo apenas a minha própria companhia, e a dos incompreendidos artistas que comigo partilham os seus sentimentos, expressos sob a forma de notas.
E eu, de palavras.

Hoje vivo de lapsos do passado. De um passado romantizado.
E recuso o presente. O presente que me sufoca.
Que me esbofeteia.
Que me mata.
Tão devagar, e tão dolorosamente.

Não quero mais gritar ao mundo as certezas de um amor incerto, até porque ódio e receio é tudo aquilo que de mim restou.
Sinto apenas a necessidade de gritar, a plenos pulmões, o silêncio.
O silêncio que disfarça o sabor amargo do ódio, do receio.
Das saudades, que sejam.
Hoje, grito apenas o que de mim restou, e aquilo que me move..
E que ao mesmo tempo me prende.

E assim, fecha-se-me o coração.
Tranca-se a alma,
e refugio-me eu debaixo dos cobertores,
em só mais um quarto trancado a sete chaves,
que é este meu corpo que me prende.

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